"NÃO HÁ NENHUMA SEPARAÇÃO ENTRE O MEU SER REAL E O MEU SER VIRTUAL. EU SOU MEU AVATAR" Jon Jacobs |
Jon Jacobs - O ator fracassado que ficou milionário vendendo terrenos e produtos virtuais que só existem na tela do seu computador
A vida de Jonathan Jacobs daria um filme. Aos 11 anos, ele escalava o muro da sua própria casa, na luxuosa Avenida Cavendish, em Londres, na década de 70, para encontrar um vizinho famoso. O garoto queria ver se Paul McCartney, que morava a cinco portas dali, estava andando nas redondezas. “Quando o via, eu começava a cantar algumas músicas e dava fitas para ele ajudar com a minha carreira”, afirma. Na mesma época, decidiu largar a escola para estudar atuação em período integral — atuando ou cantando, não importa, ele queria ser famoso.
O pai, Adrian, um polêmico investidor na bolsa de valores, achava tudo uma bobagem e estava interessado apenas em seus negócios. Mas sua mãe, Jackie White, uma ex-modelo que chegou a ganhar a coroa de Miss Reino Unido em 1962, apoiou a iniciativa. E o ápice da carreira cinematográfica de Jon aconteceu ainda na Inglaterra, em 1988, quando um curta-metragem dirigido por ele, Metropolis Apocalypse, foi selecionado para o festival de Cannes. Ele então se mudou para Hollywood e chegou a atuar, escrever e dirigir mais de 30 filmes independentes, com pouco ou nenhum sucesso comercial. Amargou tempos de dureza. E hoje, aos 44 anos, é magnata de um mundo chamado de Entropia Universe que só existe no computador e cujo Produto Interno Bruto (PIB) soma US$ 422 milhões.
DO VIRTUAL PARA O REAL
Jacobs se tornou um milionário vendendo itens e propriedades no Entropia. Nele, os jogadores cadastrados podem gastar dinheiro de verdade por meio de um cartão de crédito. Vende-se e compra-se de tudo: de armas futuristas e roupas medievais a imóveis e até um planeta inteiro. Os, digamos, habitantes do Entropia também podem fabricar vários tipos de objetos, como roupas, joias e móveis coletando recursos naturais.
Cerca de 60 tipos diferentes de minérios podem ser garimpados, e centenas de animais alienígenas liberam artigos quando são capturados, como peles e óleos. Um item ou matéria-prima tem como ser comprado e vendido pelos usuários em troca de dinheiro de verdade: uma pepita de ouro, por exemplo, custa US$ 1, já o preço de armas vai de dezenas a centenas de dólares. A moeda do jogo chama-se PED (Project Entropia Dollars) e vale um décimo do valor do dólar, não importando o câmbio atual na moeda americana. Segundo Jacobs, o game atualmente tem entre 40 mil e 50 mil usuários ativos que jogam, em média, 20 horas por mês e gastam US$ 20 no mesmo período.
A consultoria Inside Virtual Goods, especializada em auditorias de bens virtuais, anunciou que em 2011 o mercado do gênero atingirá estimados US$ 2,1 bilhões somente nos Estados Unidos. Nesse mundo de faz-de-conta que movimenta grana de verdade, Jacobs adotou a alcunha de Neverdie (nunca morre, em português). Palavra que está tatuada em seu antebraço direito e escrita com lantejoulas no peito de praticamente todas as camisetas apertadas que usa na vida real. E essa obsessão pela eterna juventude também é percebida no corte de cabelo moicano e oxigenado, sempre acompanhado de óculos extravagantes, com armação prateada e lentes roxas, e um tom de pele provavelmente conseguido em visitas frequentes às clínicas de estética de Beverly Hills.
BRINCANDO DE DEUS
Jacobs travou o primeiro contato com o Entropia em 2003. Em um ano já havia reunido vários itens raros que coletara em missões como explorador no jogo e os vendeu por US$ 25 mil. O game era uma válvula de escape para seus fracassos profissionais. “Eu não era uma estrela de cinema, mas ali eu era o herói que sempre quis interpretar. O Entropia não era um jogo para mim. Era um novo mundo, uma terra de oportunidades”, diz. O esforço dedicado ao personagem foi tão grande que ele se misturou à vida real e personalidade de Jacobs. “Não há nenhuma separação. Eu sou meu avatar. Minha família vive com o Neverdie”, diz.
Jacobs finalmente chegou às páginas de jornais e revistas, sites, reportagens de TV e documentários em 2005, ao hipotecar sua casa (real) por US$ 100 mil dólares e comprar um asteroide virtual. “Eu não tinha nada a perder, nem conseguia pagar as minhas contas. Todo mundo me chamou de louco”, diz. Sua primeira medida foi transformar parte do “terreno” num clube noturno, o Club Neverdie, onde pagava-se para entrar. A idéia pegou instantaneamente entre os usuários do game. “Eu comecei a ganhar dinheiro desde o primeiro dia”, afirma. Jacobs também recebia impostos de mineração. “Meu asteróide era rico em minérios. Alguém poderia ir lá e coletar US$ 20 em ouro e automaticamente eu receberia 5%.” A loucura se saiu bem rentável. A partir de 2006, o asteróide lhe rendia US$ 20 mil por mês e Jacobs começou a receber ofertas de compra.
RECORDE
Em novembro do ano passado, Jacobs vendeu o mesmo asteróide por US$ 635 mil para ajudar a financiar seu novo projeto, a criação de um planeta virtual só dele, o Rocktropia. O acordo foi noticiado como a maior venda já feita de uma propriedade virtual e entrou na edição de 2010 do Guinness, o livro dos recordes.
Os interessados, apesar de raramente toparem revelar sua identidade, são pessoas comuns, a exemplo do engenheiro de software russo Yan Panasjuk, 35 anos, que ganha a vida investindo em start-ups e novos negócios digitais como o Entropia, e responsável por arrematar a maior fatia do asteroide por US$ 335 mil. Em menos de dois anos Neverdie já havia ganhado mais fama e dinheiro do que Jacobs em sua vida inteira.
A versão beta do Rocktropia foi lançada em maio do ano passado. “O custo inicial foi de US$ 6 milhões, e os gastos provavelmente chegarão a US$ 24 milhões até seu lançamento oficial, em março deste ano”, diz Jacobs. A criação do planeta ficou a cargo do seu próprio estúdio de desenvolvimento gráfico, o Neverdie Studios, inaugurado no ano passado e que já conta com 13 funcionários. Jacobs passou o último ano se reunindo com executivos de gravadoras para “agendar” concertos de rock em seu planeta virtual. Sua maior estrela é o roqueiro Lemmy, vocalista da banda de hard-rock Motörhead. Jacobs construiu até um castelo para o rockstar.
A jornada de Jacobs não foi fácil. Ele teve que produzir e dirigir filmes para se dar a chance de atuar. Ele teve que distribuí-los para que fossem vistos.
“Todo dia eu acordo sabendo que tenho o que quero. Eu sou privilegiado, um sortudo. Tive uma jornada inesperada, como a de um herói grego”, diz. “E sou desiludido, até certo ponto. Mas quer saber? Eu até gosto disso”, afirma. Pensando bem, a vida de Neverdie daria um filme ainda melhor do que a de Jon Jacobs.
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